domingo, 19 de agosto de 2012

A outra face

O sol sangra esse sangue salgado
que escorre do meu rosto raso

O céu é cego
O céu é surdo

Nas paredes desse abismo
arranho minhas unhas
já não tenho minhas unhas
arranho minha alma magra
magra de fome da manhã
magra de um mar sem mim

É escuro, é estranho esse abismo
É abismo, é escuro esse estranho
É estranho, é abismo esse escuro

O céu é surdo
O céu é cego

O choro não chega
chega a chuva,
chio baixinho
O choro não chega à chuva
não chega ao sol
não chega
ao céu só
 deixa
 a
b
i
s
m
o

Do Espelho



Eu tento correr até sair daqui. Não consigo. Fugir de mim não é coisa fácil. Quando entrei aqui, pensei que seria simples viver. Sempre ao deitar, desejo estar livre desse lugar pela manhã. Bom seria se um anjo me arrastasse pra bem longe. Não quero compaixão de anjos, eu quero que me arrastem daqui. Não posso mais me ver enquanto o que vejo é tudo o que vivi e ainda vivo por esse espelho. Quebrá-lo não posso, pois caso o fizesse, teria muito mais trabalho ao recolher os pedaços; que são meus também. E essa vida não vale o trabalho de recolher esses pedaços. Viver por aqui já é um grande trabalho [...]

Não acredito em Deus, e o Diabo é a criança mais mimada que existe. Quando se fica dentro de um espelho, Deus e Diabo tornam-se sinônimos. Não costumo demonstrar a eles confiança. Se eu tiver que sair daqui, será por mim mesmo [...]

Eu tento correr, mas a cada corrida, fico mais lento. Percebi que não devo correr dentro de um espelho, é melhor voar [...]

[...]